MARS Leva Ciclo Itinerante “Palmares Vive!” a Jaguarão
Na Semana da Consciência Negra, o Museu Antropológico do RS participou da programação cultural do município alusiva ao 20 de Novembro
O Museu Antropológico do Rio Grande do Sul (Mars), instituição da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac), deu continuidade à itinerância da mostra “Palmares Vive!”, integrando-se às atividades culturais e educativas que ocorreram em Jaguarão durante a XVI Semana da Consciência Negra do município. Essa mostra é parte da exposição original do Mars “Palmares não é só um, são milhares: 50 anos do 20 de Novembro”, apresentada em 2021-2022 no Memorial do RS, e ficou aberta à visitação pública de 18 a 23/11 na sede do tradicional Clube 24 de Agosto, em Jaguarão.
“Cidadania ao Povo Negro e Políticas Públicas: caminhos para uma sociedade igualitária” foi o tema da semana de Jaguarão, organizada pelo Clube 24 de Agosto – tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae) como espaço de memória da cultura afro-brasileira no Rio Grande do Sul – em parceria com o Ilê Mãe Nice de Xangô, Coletivo Rosas Negras, Confraria Afro, Unipampa Campus Jaguarão, GEESPA Unipampa, Neabi Mocinha Unipampa, PE Pedagogia Unipampa, IFSul Campus Jaguarão e Neabi Neir Madruga.
“A oportunidade de fazermos parte das celebrações da Semana da Consciência Negra, de forma colaborativa e integrada com os coletivos negros de Jaguarão, significou muito para nós. O clube social onde a mostra Palmares Vive! foi apresentada é um símbolo da trajetória da comunidade negra de Jaguarão, um importante espaço histórico de sua resistência e afirmação”, avalia a diretora do Museu Antropológico do RS, Sylvia Bojunga.
A antropóloga Maria Helena Sant’Ana, analista do Mars, destaca que a mostra foi criada para fazer circular pelo interior do estado um conteúdo que resulta de conhecimentos e reflexões de historiadores, antropólogos e agentes negros sobre sua memória social e seus patrimônios. “Nas mediações, buscamos promover reflexões que contemplem as relações étnico-raciais, com envolvimento de estudantes e professores, comunidades quilombolas e coletivos locais”, informa.
Mais sobre a exposição
A exposição itinerante é composta por dois conjuntos de painéis contendo imagens, textos e legendas. O primeiro módulo, “Ciclo Itinerante Palmares Vive! Quilombos do RS: Resistência e Territorialidade”, sintetiza o módulo de mesmo nome da exposição original, de curadoria da antropóloga Mariana Balen Fernandes, concebido em sete painéis que expõem imagens de contextos cotidianos de comunidades quilombolas, de suas lutas e resistências, além do Maçambique de Osório, antigo e contemporâneo.
O segundo conjunto, “Palmares Vive!”, recria em sete painéis os demais módulos concebidos pelos curadores da mostra original Palmares não é só um, são milhares: 50 anos do 20 de Novembro, de forma sintética e adaptada da exposição geral. Esse módulo tematiza a instituição do 20 de Novembro como data da Consciência Negra pelo Grupo Palmares e pela liderança ativista de Oliveira Silveira, além de abordar sua trajetória pessoal, os clubes sociais negros, as artes negras jovens contemporâneas, a imprensa negra e os ativismos negros a partir do século XIX.
A Semana da Consciência Negra em Jaguarão
por Carla Souza de Camargo
O Museu Antropológico do Rio Grande do Sul participou como convidado da XVI Semana da Consciência Negra de Jaguarão, para a qual contribuiu com a exposição “Palmares Vive!” e com duas oficinas que realizamos em conjunto com os coletivos locais. Acompanhamos também, com entusiasmo, parte das diversas atividades que compuseram a semana, organizada pelos movimentos sociais negros do município.
A programação foi intensa, apesar da ausência do investimento do executivo municipal para a sua realização. Diversas atividades tiveram de ser remodeladas, mas o compromisso com a data e o comprometimento da comunidade em preencher a semana com atividades mantiveram seus eventos repletos de participação e mobilização.
É fundamental ressaltar a importância social e histórica do dia 20 de novembro de 2024, dada a relevância de a efeméride ser comemorada pela primeira vez como um feriado nacional. Apesar de toda a trajetória pelo reconhecimento e pela cidadania, apenas alguns municípios do Brasil comemoravam a data como forma de celebrar a memória de Zumbi dos Palmares e a resistência do povo negro contra a escravidão. O município de Porto Alegre, por exemplo, instituiu o Dia da Consciência Negra em 2002, como resultado de uma longa mobilização do movimento negro e de lideranças comunitárias que atuaram para garantir o reconhecimento da data no calendário oficial. Ampliar esse reconhecimento como feriado nacional é ressaltar que seu significado deve ser potencializado, assim como fortalecida a luta por direitos e justiça social para a população negra do Brasil.
No município de Jaguarão, contribuímos com uma oficina sobre a digitalização de acervos, apresentando sumariamente o processo de digitalização iniciado pelo MARS em 2023, assim como o lançamento da primeira coleção no Tainacan e as possibilidades e constrangimentos vividos nesse percurso. Foi um momento de trocas em que conhecemos, também, o trabalho do Centro de Documentação do Clube 24 de Agosto, iniciado e mantido pelo ex-presidente Neir Madruga Crespo em parceria com acadêmicos do curso de história da Unipampa, campus Jaguarão.
Uma segunda ação desenvolvida pelo MARS, com a presença de representantes do Quilombo Madeira, foi a Roda de Conversa sobre Políticas Públicas Quilombola e sua relação com as políticas de memórias e acervos.
Acompanhamos duas atividades de cunho acadêmico: as falas sobre os “Colonos Africanos na Formação do Rio Grande do Sul”, do professor Dr. Lucas Costa Gomes, do IFSul – Campus Jaguarão, e o VII Seminário Integrado do GEESPA, com a apresentação “Moleques, Peraltas e Menores: as Disputas sobre a Infância e Juventude Negra no Rio Grande do Sul”, do Prof. Me. José Resende Junior. Foi uma oportunidade de repensar, por meio da pesquisa, dos dados e da estética, como apresentar a presença negra no estado do Rio Grande do Sul, em especial nessa região de fronteira com o Uruguai, para além das inegáveis marcas da escravidão – não como um apagamento, mas como uma estratégia de positivar essa presença em todos os aspectos da formação da identidade social e cultural do estado.
Conhecemos, ainda, a oficina “Territórios Negros em Jaguarão”, conduzida pelo Prof. Dr. Caiuá Cardoso Al-Alam e pelo GEESPA, na qual diversos territórios da cidade, marcados pela presença da população negra, são percorridos a pé. Essa atividade proporcionou uma mediação pedagógica que dá visibilidade à presença negra na construção e desenvolvimento da cidade.
No dia 20 de novembro, percorremos a cidade de Jaguarão na Marcha Zumbi e Dandara dos Palmares junto à comunidade de Jaguarão, animados pela alegria contagiante da presidente do Clube 24 de Agosto, Patrícia Oliveira Crespo Nunes. Segundo as palavras de Patrícia, o que movia a marcha era “a nossa alegria, o nosso sorriso, o nosso samba e a nossa festa”, ensinando-nos a positivar sempre a presença negra como produtora de espaços de sociabilidade, para além das inegáveis marcas e heranças do grande contingente de população escravizada na cidade. A marcha finalizou em um momento no Clube 24 de Agosto, onde pudemos acompanhar diversas apresentações culturais e oportunizar aos participantes o conhecimento da Mostra “Palmares Vive!”, que estava em exposição.
O ponto alto para nós, equipe do Museu Antropológico, foi o relato do ex-presidente do Clube, senhor Neir Madruga, que nos contou sobre a visita das bisnetas da Rainha Eugênia Cardoso Silveira à exposição e o reconhecimento da importância da avó, a primeira a ganhar o título no Clube 24 de Agosto. A mostra, que exibe o retrato da presença negra, ressaltando principalmente a estética, assim como a beleza e pompa das rainhas negras dos bailes do Clube 24 de Agosto – espaço de sociabilidade e mobilização da classe trabalhadora negra, fundado em 1918 –, é motivo de muito orgulho para o Museu Antropológico.
Após o encerramento da semana, a mostra itinerante seguiu para o campus da Universidade Federal do Pampa, onde ficará até o encerramento do semestre letivo. Agradecemos ao Clube 24 de Agosto e à comunidade acadêmica do campus Jaguarão da Unipampa pelo acolhimento e parceria, desejando que possamos ajudar a construir um futuro mais inclusivo e respeitoso aos direitos da população negra.
Finalizamos convidando todos a conhecerem o Clube 24 de Agosto, em Jaguarão, e o importante trabalho desenvolvido junto à Unipampa para o reconhecimento público da importância social, histórica e atual de sua existência para a comunidade negra de Jaguarão e do Rio Grande do Sul.